Nosso país pela visão do povo

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Quantos mais precisam morrer?


No Título VIII, Capítulo II, Seção II, o Art. 196 da Constituição Brasileira consta o seguinte texto: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação", ou seja podemos simplesmente para fácil entendimento dizer com toda certeza que "A saúde é DIREITO de todos e DEVER do estado".

Neste artigo, perceberemos que apesar de ser um direito constitucional, a realidade está longe de ser tão boa. Aliás, está muito distante até mesmo de um mínimo aceitável para um país tão grande e riquíssimo como o Brasil. E este é um problema de todos, pois a qualquer momento poderemos necessitar de socorro público. Esta foi minha situação em três incidentes no decorrer destes últimos 12 meses, onde familiares ou conhecidos que precisaram, não tiveram outro destino que não o óbito do paciente.


Como primeiro caso, citarei meu pai, Will Monteiro Soares. Ele sofria de mal de Parkinson por aproximadamente dois anos, a contar de seu falecimento no final de 2010. Um dia antes, meu pai acordou pela manhã muito mal. Não conseguia falar, nem se movimentar normalmente e gemia MUITO de dor. Liguei para o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) em busca de socorro, pois não tínhamos (eu, meu irmão e minha mãe) condição de sequer entender o que estava acontecendo. Tentei três vezes e obtive a mesma resposta: "Você deve levá-lo ao hospital".

Eu tentei em todas as ligações apelar para o bom-senso informando que precisaria da ambulância para poder fazer isso e que era mesmo esse o motivo da ligação. INCRIVELMENTE o socorro nos foi NEGADO. Não mandariam ambulância alguma para transportar meu pai ao hospital. Então, não mais podendo esperar, pedi ajuda para meu irmão e outras pessoas do prédio, pegamos meu pai no colo, descemos dois lances de escada, colocamos meu pai no carro da forma que foi possível e corri para o hospital.

Chegando ao Hospital Salgado Filho, no Rio de Janeiro, percebi que existem "profissionais" denominados de "maqueiros" (quem pode pegar macas ou cadeiras de rodas e transportar pacientes pelo hospital). Gritei por eles, que estavam calmamente conversando em um canto da área externa. Não obtive resposta. Gritei por ajuda novamente e, sem resposta, corri para onde as macas estavam amarradas para arrancar uma. Neste ponto um deles se levantou, mas só me alcançou quando eu estava com a maca no carro, já tentando colocar meu pai nela. Então meu pai deu entrada no hospital e ficou no que chamam de "Sala Vermelha", onde hipoteticamente ninguém pode entrar e possui recursos "semelhantes" a um CTI. Meu pai passou o dia todo e a noite nesta sala.

Não cheguei a ver mais meu pai com vida.

No segundo caso, eu não estava presente. Aconteceu com a avó de minha companheira no meio deste ano de 2011. Ela sofria de úlcera e em um ataque, chegou a vomitar o que pareceu um litro de sangue. Todos na casa (filhos e netos presentes) ficaram desesperados. Obviamente não sabiam o que fazer e, assim como em meu caso, chamaram o SAMU.

Neste meio tempo entre várias ligações para o SAMU, que informava sempre que estavam à caminho, também ligaram para o Corpo de Bombeiros. Então, quase depois de uma hora a contar da primeira ligação e MUITO sangue vomitado, os bombeiros chegaram e constataram o óbvio. O caso era GRAVÍSSIMO e não poderiam ajudar. Eles mesmos ligaram mais vezes para o SAMU até que enfim, uma ambulância chegou.

Foi um tempo precioso perdido. A avó de minha companheira deu entrada no Pronto Socorro de Cuiabá. O mesmo que foi alvo de reportagens recentes nos jornais locais e, por isso mesmo, encontra-se fechado, já que não apresentava condições de limpeza e estrutura mínima para garantir a sobrevivência de quem quer que fosse. Nenhum tratamento foi realizado. A única atitude tomada foi uma sonda que drenava continuamente o sangue de seu estômago e a aplicação de bolsas de sangue para repor o perdido. A resposta padrão era: "Vamos esperar e observar".

Ela resistiu perdendo sangue por bravos dois dias, tristemente somente sendo observada.

O terceiro caso e mais recente, terminou com o óbito no dia 19 de novembro de 2011 do pai de uma amiga minha, Renata de Almeida, no Hospital Carlos Chagas no Rio de Janeiro. Neste caso, acabou virando inclusive uma reportagem da emissora Bandeirante. Veja seu vídeo abaixo:


Agora vejam o absurdo do que é dito na reportagem. Estamos precisando entrar na justiça para poder TENTAR tratar de nossos parentes. E ainda assim, não conseguimos. Seja por falta de resgate, remoção, médicos, equipamentos, leitos, tratamento e até mesmo atenção e boa vontade. Estes últimos, toda população sabe que o profissional de saúde é mal pago pelo estado, mas este não pode ser motivo de má vontade e tratamentos mal feitos, pois as vidas de pessoas estão em risco.

Não consigo compreender como sediaremos uma Copa do Mundo e Olimpíadas se sequer conseguimos cuidar de nosso povo de maneira no mínimo digna, mesmo sendo direito garantido.

Sobre este último caso, o também meu amigo Rodrigo Costa, marido da Renata de Almeida fez o seguinte comentário em seu Facebook: "É o tipo de coisa que sempre vemos na televisão e nos omitimos, acreditando que nunca acontecerá conosco. Aconteceu com a minha família e pode acontecer com a família de outro amigo seu... vamos mudar essa história". Complementando seu comentário, "também aconteceu com a minha família". Então nós todos precisaremos perder alguém desta forma para que se tome atitude, ou exigiremos dos governantes o nosso direito? Somente os ricos podem ser tratados dignamente em hospitais luxuosos e modernos?

Outro de meus amigos, Fabio Lira, comentou: "O povo precisa fazer algo. Precisamos deixar de ser acomodados, e nos preocuparmos com o que realmente é importante e não com futilidades e coisas que satisfazem somente o nosso bel-prazer. Isso precisa acabar. A saúde publica, é direito de todo cidadão, e é dever do estado proporcionar, com qualidade, e melhores condições, pois ela é financiada pela população através do pagamento de impostos e contribuições sociais".

A citação de hoje será um pouco maior:

"Money is the most important thing in the world. It represents health, strength, honor, generosity and beauty as conspicuously and undeniably as the want of it represents illness, weakness, disgrace, meanness and ugliness (O dinheiro é a coisa mais importante do mundo. Ele representa saúde, força, honra, generosidade e beleza, visivelmente como a falta dele representa doença, fraqueza, desgraça, maldade e fealdade)."
John Bull's other island: and Major Barbara - página 171, Bernard Shaw - Brentano's, 1907


Um comentário:

  1. É João, nesse pais os governantes fazem o que querem e o povo distraido com outras coisas.
    Até quando isso continuará acontecendo, até quando?

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